Nunca pretendi ser
senão um sonhador. A quem me falou de viver nunca prestei atenção. Pertenci
sempre ao que não está onde estou e ao que nunca pude ser. Tudo o que não é
meu, por baixo que seja, teve sempre poesia para mim. Nunca amei senão coisa
nenhuma. Nunca desejei senão o que nem podia imaginar. À vida nunca pedi senão
que passasse por mim sem que eu a sentisse. Do amor apenas exigi que nunca
deixasse de ser um sonho longínquo. Nas minhas próprias paisagens interiores,
irreais todas elas, foi sempre o longínquo que me atraiu, e os aquedutos que se
esfumavam - quase na distância das minhas paisagens sonhadas, tinham uma doçura
de sonho em relação às outras partes da paisagem - uma doçura que fazia com que
eu as pudesse amar.
Fernando Pessoa
Fernando Pessoa
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